A sintonia cria coreografias espontâneas. É precioso observar os movimentos dessa dança, e por mais trabalhoso que seja chegar nesse ponto de confluência é recompensador participar.
Este ano, fui presenteada com um encontro único, fazedor de coreografias que nunca imaginei fazer parte. O coletivo Meninas Fazenda se juntou com a escola de artivismos Otratierra e produziram uma residência artística especial. Meninas e mulheres dançaram, teceram e criaram juntas.
Por 2 semanas nossa casa foi a Fazenda Sant'anna no Bairro do Agudo em Bragança Paulista. Fomos recebidas por Mimes, a menina-mulher fazenda que fez essa reunião ser possível.
Mimes teve a ideia bonita de juntar Dona Júlia, Rafa, Duda, Gaby, Lolo, Jujis, Fran, Larinha e quem quiser fizer parte pra ser menina ou menino fazenda. Esse coletivo faz arte, vídeo, festa, conversa, sabe cuidar da natureza e dos animais.
O trabalho das meninas fazenda é lindo e sensível. E abençoada seja a internet porque nosso primeiro contato foi pelo Instagram! Começamos a conversar em 2021, e nessa troca já existia a vontade de ir conhecer o trabalho das meninas presencialmente. Mas pelos desencontros e correrias da vida achava esse sonho um pouco distante. Na minha cabeça me planejava pra um dia acontecer, mas não sabia quando seria possível.
Que alegria foi receber o convite da Mimes para tentar essa residência que estava sendo desenhada com muito carinho pelo seu coletivo e pela escola Otratierra. Em um processo totalmente novo pra mim me inscrevi na curadoria coletiva de artistas.
Conduzidas por Nirlyn e Meli, as mediadoras e formadoras da Otratierra, as artistas inscritas começaram a se encontrar virtualmente e a mergulhar na temática Mulher - Território. Ao final desses encontros tínhamos o grupo definitivo para criar a residência presencial, com mulheres do Brasil, Equador, Venezuela, Colômbia e Chile. Então, Nile, Javi, Ori, Mari, Carol, Hana, Isa, Suzana, Anahí, Nirlyn, Meli e eu saímos de nossos territórios para encontrar com as meninas fazenda.
Aí nossa dança aconteceu! Cada menina e cada mulher com seu ritmo e melodia foi bailando. Digo dança porque os nossos movimentos quando estavam afinados teciam momentos lindos: produzimos oficinas, nos revezamos nos cuidados da casa, no preparo das refeições, nos cuidados da fazenda. E cada passo dessa dança carregava muito ensinamento.
A cozinha e a mesa das refeições foram palcos que guardo no coração. Primeiro pareceram bem desafiadores, com o peso da tarefa de cozinhar para 13 ou mais pessoas, acertar no tempero, consistência e quantidades. Mas ali nossos dias ganharam (muito) sabor e mesmo nos erros fomos entendendo o caminho para que começássemos as tarefas juntas, partilhando. Mesa alegre é lugar de fartura e aconchego e a Fazenda Sant'anna proporcionou os ingredientes necessários para essa combinação ❤.
As oficinas de arte foram momentos de brilho, emoção e brincadeira. Cada grupo de artistas residentes + meninas fazenda fez com que conhecêssemos mais o espaço que estávamos habitando e partilhar sobre nosso corpo-território, nossas histórias, memória, imaginações e sonhos carregados. Nossas ideias encontraram a materialidade do papel, do tecido, da caminhada, da coleta, da performance, da fala e da escuta.
Na fazenda tivemos sempre o apoio de Adilson, João e Pierre. Com eles aprendemos mais sobre os cuidados com os animais, conseguimos materializar projetos em madeira e fomos salvas no momento de usar o fogão a lenha haha. E em todos nossos trânsitos para dentro e fora da fazenda, e auxiliando na logística e materiais da residência tivemos o apoio de Marcel. Os meninos fazenda somaram sempre na hora certa. Foi um prazer conhecê-los.
A Fazenda nos acolheu e o Bairro do Agudo nos abraçou. Participamos do evento “Fazendo Arte com Meninas Fazenda”, no terreno da Igreja São Martinho, lá nos reunimos com a comunidade do bairro. Ali palavras sussurradas se transformaram em bordados, um grande tecido, o manto dos sonhos, recebeu desenhos e mensagens de gente de toda idade, dançamos ao som da moda de viola, e ao som dos ritmos da nossa diversa américa do sul. Caminhando um pouco além da igreja, um muro recebeu cores novas, materializamos um desenho da artista-muralista Isa Guizalberti, e cada uma e cada um que passou por lá contribuiu adicionando um desenho na colcha de memórias do bairro.
Jorrariam mais mil e uma palavras para descrever o que foram esses dias no Agudo, sentimentos bonitos me abraçaram e os momentos mais difíceis que passamos juntas me ensinaram muito. A mangueira que subimos, que dançamos embaladas por sua brisa e deitamos embaixo, tocou nosso peito e guardou nossos segredos. Feliz e agradecida por esse encontro único que virou semente pra brotar mais sonhos.
Obrigada por ter lido até aqui e por favor, se ainda não conhece, vá conhecer o trabalho incrível das meninas e mulheres que fizeram esse encontro (links instagram):
artistas residentes: ori perez , suzana rievers , anahi asa , carolina botura , mari teixeira , javi asenjo , nile cohen , hana brener e isa guizalberti
E se estiver passando por Bragança Paulista por essa semana, aproveite até o dia 28/10 está acontecendo a exposição “Menina Mulher Terra Território” no Centro Cultural, das 8h às 18h, de segunda a sexta-feira, com entrada gratuita. Com obras das meninas fazenda, obras frutos da residência e algumas produções das artistas residentes.
e para embalar a semana, indico a playlist linda que a Mimes fez:
um beijo e até a próxima,
lelê